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O que avião, ventilador e internet têm em comum

Por Carlos Nepomuceno

Data de Publicação: 02 de Abril de 2007

A nossa capacidade para responder a atual equação proposta pela história e gerar ações humanistas que protejam o ser humano das mudanças nocivas que ela também trará é a peça chave para o futuro de cada um.

Certa vez, perguntaram a duas pessoas o que significava para a história do homem o recém-inventado avião. Um supôs que era um ótimo ventilador; o outro, que o aparelho iria encurtar a sensação do tamanho do planeta.

Ao se pensar nas inovações ao longo da história, sugere-se que os produtos, processos ou serviços podem ser classificados de duas maneiras:

Os incrementais: melhoras pequenas em produtos existentes;

Os revolucionários: sem precedentes e sem características já conhecidas, que promovem melhoras significativas de desempenho e/ou custo, além de transformar e/ou criar mercados.

Acredito, entretanto, que as inovações radicais permitem, de forma recorrente, possibilidades e oportunidades diferentes na sociedade, dependendo da área em que estão inseridas.

Existem inovações mais ou menos radicais do que outras, que podem variar de intensidade ou da capacidade de gerar ondas em função das áreas das quais se originam.

Uma inovação radical, por exemplo, em metalurgia pode ter conseqüências menores para a sociedade do que uma em mecânica, ou vice e versa, bem como, existem inovações radicais diferenciadas em maior ou menor grau em qualquer área.

Existem, porém, áreas especiais nas quais inovações radicais têm mais impacto e são, por causa disso, mais sensíveis do que outras.

As mudanças ali devem receber um peso maior devido à sua amplitude, diante das possibilidades e oportunidades que se abrem para a sociedade.

Inovações radicais nos meios de transporte, por exemplo, no ir e vir: carruagem, trem, carro, avião. Ou na medicina, antibiótico, vacinas, clonagem são algo que geram fortes alterações sociais.

Ambas não deveriam merecer pesos maiores pela abrangência ao se projetar suas repercussões para o futuro?

Imagine se inventam o teletransporte ou o helicóptero pessoal? Ou clones de pessoas com maior capacidade física e intelectual?

As conseqüências, por tendência histórica, serão, certamente, mais relevantes do que outras.

Defendo que ao avaliarmos inovações radicais nessas áreas transversais a toda a sociedade devemos ter uma atenção especial, atribuindo peso maiores a determinadas áreas do que outras.

Como, por exemplo, mudanças na comunicação, uma atividade humana que faz parte do dia-a-dia de todas as pessoas.

Na verdade, a comunicação é uma espécie de .tubo. por onde passam as informações, que criam o oceano do conhecimento humano.

Sem comunicação, só existiriam macacos.

O estudo das possibilidades de cada grande inovação é a atividade fim dos gestores e dos agentes de capital de risco ao investir em novos projetos: cálculos de oportunidades e impactos.

(Imagino, aliás, que as fórmulas devem ser bem mais complexas da que vou apresentar).

Calculam, assim, por diferentes interesses e pontos de vista, o impacto daquela dada inovação nos negócios ou na sociedade das possíveis oportunidades que se apresentam.

Assim, em uma fórmula, poderíamos ter:

Impacto social = grau de inovação x área de origem

Quanto mais transversal a área e mais radical a inovação, mais possibilidade de mudanças. Assim, o peso exponencial da comunicação seria talvez 5 e transporte e medicina, 4, ficando a metalurgia e a mecânica com valores menores, a título de abstração, que completaria a equação abaixo:

IS = GI(x)(1) x AO(x)

  • IS = Impacto social
  • GI = grau de inovação
  • AO = área de origem

Em que os exponenciais podem de ir de 1 a 5, por exemplo.

Pelo seu passado, recheado de melhorias significativas, desempenho, redução de custo, transformação e criação de mercados, podemos caracterizar, sem pestanejar, que a internet é uma inovação radical.

E, entre tantas inovações incrementais nas tecnologias de informação, a web é, antes de tudo, uma inovação radical com peso máximo numa área que também se encaixa entre as mais sensíveis.

O que multiplica, como já vimos, em toda a sociedade ainda mais sua amplitude, aumentando o valor na fórmula:

IS = GI(5) x AO(5)

  • IS = Impacto social
  • GI = grau de inovação = radical no maior grau
  • AO = área de origem = comunicação . pontuação máxima

Pierre Levy, filósofo francês da Cibercultura, considera que uma inovação radical na comunicação com a mesma dimensão da web só pode ser comparada à invenção da escrita, do papel e depois a prensa de Gutemberg.

Esta última há 500 anos, que provocou na época grandes transformações, como a Reforma Protestante na Alemanha, através das novas idéias veiculadas para um novo público, via novos jornais e livros, que permitiram e impulsionaram as revoluções industrial, francesa, americana, soviética, moldando o atual mundo moderno.

Somos filhos de Gutemberg, como nossos tataranetos serão da web.

Lévy considera que o ciberespaço é o novo e primeiro ambiente a distância que permite pela primeira vez a comunicação de muitos para muitos dos blogs, Orkuts e Wikipedias, onde podemos, como nunca, predominar a nova comunicação horizontal de massa frente a atual vertical (das tevês, rádios e jornais).

No livro Conhecimento em Rede, da editora Campus, meu e de Marcos Cavalcanti, apoiamos a tese de novo paradigma e aprimoramos estas teorias de Lévy.

E, a partir daí, podemos voltar a pensar de novo na historinha do avião, ao percebermos que as atitudes das pessoas frente ao fenômeno internet está ligada aos valores que colocam na equação apresentada, que é feita de alguma forma na cabeça de cada um, ao atribuir o grau de atenção que vai dar para determinada coisa.

(Quanto mais relevante for o fato, mais tempo você se dedicará a ele. Um assalto em outra cidade recebe uma nota baixa, mas no vizinho exige uma ação imediata).

Quanto menos radical acham que a internet é e quanto menos percebem o papel multiplicador da comunicação na sociedade, menores valores atribuem à formula dada. Menos se preocupam. Menos incorporam os novos conceitos no seu dia a dia e aos novos projetos.

No início, quando tudo ainda é nebuloso, é tudo uma questão de aposta. Mas conforme os dados vão aparecendo, como já é o caso, é sempre tempo de ir reavaliando a pontuação.

É o que podemos chamar de dilema da altura: de que ponto de vista ou dimensão cada um consegue subir em grandes momentos impulsionados por inovações radicais em áreas sensíveis?

Onde cada um consegue subir? Cadeira? Escada? Ou montanha?

(Não é a toa que Lévy - que nos traz uma visão (de e) da montanha - é filósofo e cumpre seu papel de acender lanternas do alto do platô nas grandes crises e mudanças).

O verdadeiro resultado da equação apresentada - ainda carente de estudos acadêmicos - já tem demonstrado que os fenômenos inovadores incrementais dentro da revolução web (Google, Linux, Skype, MSN, Wikipedia, Orkut, etc) não têm explicação plausível sem que os números da equação se aproximem cada vez mais do máximo.

Podemos dizer, por fim, caso nossas equações se confirmem, que essa mudança na comunicação possibilita (e possibilitará) e provoca (e provocará) um efeito dominó cada vez maior na sociedade, atingindo, entre tantas, as seguintes peças em fileira: informação, conhecimento e inovação, as três cada vez mais estratégicas para a geração de riqueza na nova sociedade do conhecimento, arrastando atrás de si profundas mudanças políticas, sociais e econômicas, ainda incipientes, por mais que já estejamos espantados.

A nossa capacidade e velocidade para responder adequadamente esta equação proposta pela história e ter a capacidade de gerar ações humanistas que protejam o ser humano das mudanças nocivas que ela também trará é a peça chave para o futuro de cada um, do Brasil e do planeta.

Aposto nisso. E você?

Sobre o autor

Carlos Nepomuceno é Doutorando em Ciência da Informação pela Universidade Federal Fluminense é consultor e jornalista especializado em Tecnologia (Informática e Internet), com larga experiência em projetos nestas áreas. Foi um dos primeiros webmasters do Brasil. Atualmente, presta consultoria permanente para as seguintes instituições: Petrobras, IBAM e Sebrae-RJ. É professor do MBA de Gestão de Conhecimento do CRIE/Coppe/UFRJ, com a cadeira "Inteligência Coletiva" e coordenador do ICO - Instituto de Inteligência Coletiva.

É autor, com Marcos Cavalcanti, do livro O Conhecimento em Rede Publicado pela Campus/Elsevier, é o primeiro livro no Brasil a discutir a WEB 2.0, a levantar paradigmas quanto à inteligência coletiva e a mostrar, na prática, como implantar projetos desta natureza. O livro trata desta nova revolução cultural, social e tecnológica a que todos estamos expostos.

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