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Web 2.0: cuidado com o tiro pela culatra!

Por Carlos Nepomuceno

Data de Publicação: 16 de Agosto de 2007

Estamos diante de um impasse: uma nova geração sabe como é bom e produtivo estar em um ambiente como o Orkut. Mas a escola, a empresa e a própria sociedade não estão preparados para essa nova realidade.

Fui almoçar com um professor da Universidade Federal Fluminense.

Ele é um dos entusiastas do uso das redes sociais na UFF e está experimentando o Orkuff, projeto que utiliza o Icox, software livre para criação de redes sociais.

Pois bem, discutimos como foi o primeiro semestre, no qual ele abriu uma comunidade para que os alunos de sua turma administração participassem.

Professor - Nepô, os alunos não estão participando, preferem o Orkut.
Eu - Você alterou algo na sua disciplina para que eles participem?
Professor - Não, a estrutura é mais ou menos a mesma.
Nepô - Talvez aí esteja o problema.

Saí pensando sobre o assunto e estou cada vez mais convencido que não adianta querermos implantar um novo paradigma de comunicação das redes sociais em estruturas hierárquicas e verticalizadas, como tradicionalmente é o caso de uma universidade.

No livro O Lado Oculto das Mudanças - A Verdadeira Inovação Requer Mudança de Percepções, de Luc de Brabandere, o autor diz uma verdade muito inquietante.

Primeiro, precisamos mudar a maneira como vemos o mundo para depois conseguir alterá-lo.

Assim, a prática de instalação do Icox, na UFF e em outros locais, tem demonstrado que não basta uma ferramenta Web 2.0 em uma escola ou empresa 1.0.

Ou se muda a empresa e a escola, construindo uma nova maneira de organizar a estrutura, ou os projetos Web 2.0 serão muito interessantes, bonitinhos, modernos, mas tendem ao fracasso.

Notem que o Orkut, por ser implantado na rede, aterrissou em cima de uma estrutura física inexistente, reunindo pessoas e criando uma nova forma de organização social, na qual o conteúdo vem de baixo para cima.

As pessoas passam a ter uma identidade, definem gostos e dizem com quem querem se relacionar.

Ao migrar esse conceito para estruturas reais, obviamente haverá uma falta de sintonia entre a organização na web e a que existe fora dela.

Uma coisa passa a não rimar com a outra. Claro que já existem empresas que trabalham mais em rede do que outras e essas terão mais facilidade, mas, de qualquer forma, a liberdade de participação nas pontas é um choque cultural gigantesco.

(A IBM, por exemplo, está vivendo um projeto desse tipo e acaba de lançar o Lotus Connections, que é apenas um Orkut para grandes empresas.)

Assim, projetos Web 2.0 não são tecnológicos, mas culturais, de gestão, que deve envolver uma reflexão de toda a organização e não apenas mais um projeto ~Sda galera da informática~T ou ~Sda gestão do conhecimento~T, ou ~Sdo Recursos Humanos~T.

Não basta instalar uma ferramenta.

No fundo, estamos diante de um impasse.

Uma nova geração está vendo como é bom e produtivo estar em um ambiente como o Orkut, mas a escola, a empresa e a própria sociedade não estão preparadas para essa nova realidade.

Agora é um problema de cabeça e não mais tecnológico, já que o Icox, por exemplo, está na rede e é de graça!

Diante disso, tenho tentado em outro projeto no curso de MBA em Gestão de Conhecimento Crie da UFRJ repensar a própria escola.

Neste semestre, os alunos fizeram como trabalho de final de curso o que seria a tal Escola 2.0. Podemos dizer que não sabemos exatamente o que será, mas já temos algumas pistas do que com certeza não pode mais ser, a saber:

  • Por que uma turma que sai de uma disciplina não deixa nada para a nova que vai entrar e por que não continua acompanhando as novidades, caso queira, em um ambiente virtual?
  • Por que os alunos não podem ler o trabalho dos outros alunos entregues hoje apenas para o professor, ampliando a responsabilidade do professor ao dar nota e do aluno ao publicá-lo?
  • Por que os novos alunos não podem melhorar o trabalho dos ex-alunos?
  • Por que todos os alunos e professores não podem ampliar os links, bibliografias, vídeos, áudios, num processo contínuo, criando algo como a ~Sdisciplina que aprende~T, durante e depois do curso?
  • Por que disciplinas com o mesmo conteúdo em outras instituições não podem compartilhar o mesmo assunto, criando um anel de conhecimento multi-instituições?

Ou seja, como disse Pierre Lévy na sua entrevista, nessa visita recente ao país, em agosto de 2007, acredito que a web veio para mudar o mundo e construir uma nova sociedade.

Qualquer coisa diferente disso, infelizmente, ou felizmente, vai se mostrar capenga e não vai dar certo!

Se não é para mudar de fato, sugiro não se mexer com a Web 2.0. Vai ser gastar tempo e dinheiro e o tiro pode sair pela culatra!

Sobre o autor

Carlos Nepomuceno é Doutorando em Ciência da Informação pela Universidade Federal Fluminense é consultor e jornalista especializado em Tecnologia (Informática e Internet), com larga experiência em projetos nestas áreas. Foi um dos primeiros webmasters do Brasil. Atualmente, presta consultoria permanente para as seguintes instituições: Petrobras, IBAM e Sebrae-RJ. É professor do MBA de Gestão de Conhecimento do CRIE/Coppe/UFRJ, com a cadeira "Inteligência Coletiva" e coordenador do ICO - Instituto de Inteligência Coletiva.

É autor, com Marcos Cavalcanti, do livro O Conhecimento em Rede Publicado pela Campus/Elsevier, é o primeiro livro no Brasil a discutir a WEB 2.0, a levantar paradigmas quanto à inteligência coletiva e a mostrar, na prática, como implantar projetos desta natureza. O livro trata desta nova revolução cultural, social e tecnológica a que todos estamos expostos.

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