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Por José Antônio Milagre
Data de Publicação: 10 de Fevereiro de 2009
Sempre achei o YouTube fantástico, mas também sempre tive aquela sensação de que "faltava algo", até que conheci a simplicidade do justin.tv, o "YouTube" ao vivo, site em que qualquer um pode transmitir conteúdo em tempo real, bem como assistir, agregar fans, etc. Está viajando? Basta um notebook e uma internet para assistir conteúdos e seu programa favorito Empresas já estruturam canais específicos no Site. Marketeiros já desenvolvem ações no portal. Mas de "videocasts" a internet está cheia, então, porque estamos falando do Justin.tv
O Conteúdo é variado, eis que já se pode esperar o que é publicado ao vivo, de desenho do "Bem 10" ao namoro de adolescentes menos tímidos (Embora se possa fechar as salas e advertir sobre o conteúdo dos canais). Mas o problema mesmo vem na retransmissão de conteúdos pagos ou até mesmo da Tv aberta.
Quem, não está assistindo os campeonatos estaduais de futebol na Internet?
Para a TV paga é realmente o "caos" eis que basta um assinante esperto para retransmitir o conteúdo pela Internet, a centenas de milhares de pessoas que não teriam condições para assinar os pay-per-view. E até mesmo quem tem condições, está cancelando os serviços e correndo para frente do computador.
Ponto adicional? Chega de brigas com as companhias, aliás, apresento o ponto adicional da Era do conhecimento:
E na Tv Aberta? No que isto impacta? Em tudo! Sabe aquelas jogadas comerciais dos campeonatos em não transmitir para as cidades onde é o jogo? Acabou. Sabe aquela parte mais "picante" de um talk show que você só pode ver se pagar? Já era. Aquele jornal regional que você não poderia assistir? Agora pode!
Não se pode controlar mais nada, pois a qualquer momento o conteúdo vaza para o "Justin.tv".
Mas tudo isso é legal? No Reino Unido as manifestações são para o "Não" (1)
Nos Estados Unidos a Guerra começou com os problemas das Ligas Esportivas e NBA (2).
Bem, no Brasil, a Lei de Direitos Autorais (9610/1998) prevê que depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou científica, mediante exibição audiovisual, cinematográfica ou por processo assemelhado.
Assim, "espelhar" conteúdos de TVs fechadas na Internet é considerado Pirataria.
Mas e na aberta?
Igualmente, as Tvs tem o chamado de Direito "exclusivo de reprodução", por radiodifusão, eis que na transmissão via IP, a TV não tem como apurar sua "audiência" e com isso, terá impacto financeiro em decorrência de uma utilização indevida de seu conteúdo (Haverá diminuição no número de tvs ligadas)
Além disso, a transmissão de conteúdos de tvs "ao vivo" na Internet, embora polêmico, já é considerando "execução pública" pelo ECAD, sendo que sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e fonogramas, em representações e execuções públicas.
Assim mesmo que as TVs autorizassem o espelhamento, ainda assim, seriam devidos royalties aos proprietários dos conteúdos, pela "execução publica virtual" (Conceito do ECAD que não concordo nem por aproximação).
Também, segundo o velho Código Brasileiro de Telecomunicações, Lei 4117/62, que define radiodifusão como serviço destinado a ser recebido direta e livremente pelo público em geral, compreendendo radiodifusão sonora e televisão, a interceptação de sinais "fechados" seria crime, vejamos:
Art. 56. Pratica crime de violação de telecomunicação quem, transgredindo lei ou regulamento, exiba autógrafo ou qualquer documento do arquivo, divulgue ou comunique, informe ou capte, transmita a outrem ou utilize o conteúdo, resumo, significado, interpretação, indicação ou efeito de qualquer comunicação dirigida a terceiro. § 1º Pratica, também, crime de violação de telecomunicações quem ilegalmente receber, divulgar ou utilizar, telecomunicação interceptada.
Destaca-se que no Brasil, também, embora posição minoritária, o "gato sinal elétrico", ou o "gato de tv í cabo", já foi considerado por algumas câmaras dos Tribunais como crime de furto, como despacho emitido pelo extinto TAC de São Paulo:
"Furto de energia. Agente que subtrai, por meio de ligações clandestinas, teletransmissões via cabo, de considerável valor econômico. Caracterização: o ilícito penal a que faz menção o art. 35 da Lei nº 8.977/95. pelo qual deve ser condenado o agente que subtrai, por meio de ligações clandestinas, teletransmissões via cabo de considerável valor econômico, é o disposto no art. 155, 'caput', c.c. seu §3º, do CP. As imagens de um serviço de televisão a cabo somente chegam ao seu destino impulsionadas por ondas eletromagnéticas, configurando sua subtração, portanto, furto de energia" (TACrim, Apelação nº 1334393/2, Rel. Dr. Oliveira Passos, j. 26/06/2003).
E quem assiste?
Muito se fala em receptação, previsto no art. 180 do Código Penal. Não entendemos que quem navega por canais do justin.tv possa ser punido por recepção. Não com o Código Penal que temos, de 1940! Aliás, existe toda um limiar investigativo no que diz respeito a estas atividades na Internet. Me diga quem pode precisar quem foram os usuários que acessaram o canal x em um período? Rapidamente?
Mas e com a "Lei do Senador Azeredo", o que muda?
í aí que encontrávamos toda a polêmica e a possível punição criminal nítida para quem assistisse ou recebesse conteúdos, eis que no seu artigo 285-B, a lei previa que:
Art. 285-B Obter ou transferir dado ou informação disponível em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado, sem autorização ou em desconformidade í autorização, do legitimo titular, quando exigida:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Parágrafo único. Se o dado ou informação obtida desautorizadamente é fornecida a terceiros, a pena é aumentada de um terço.
Dava para entender o porquê do "Não ao Projeto". Recebeu sem querer um e- mail com pirataria? Ninguém mandou, será punido! Na hipótese acima, receber um e-mail com conteúdo protegido, mesmo que "não solicitado", poderia levar o usuário í punição. Este artigo foi modificado, e hoje está:
Art. 285-B. Obter ou transferir, sem autorização ou em desconformidade com autorização do legítimo titular da rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado, protegidos por expressa restrição de acesso, dado ou informação neles disponível:
Assim, a questão do justin.tv ainda continua afeta ao Direito Autoral e ao crime previsto no artigo 184 do Código Penal, a Violação do direito do Autor.:
Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. § 3o Se a violação consistir no oferecimento ao público, mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para recebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda, com intuito de lucro, direto ou indireto, sem autorização expressa, conforme o caso, do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor de fonograma, ou de quem os represente: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Destaca-se também que os criadores de canais estão lucrando com publicidade, pois fica fácil pinçar um "BBB" pago e vincular na página um "banner" de um produto ou serviço, levando os méritos e atraindo audiência í s custas alheias, nítida "concorrência desleal".
Deste modo, embora o Justin.tv não esteja sob a égide da legislação brasileira, nada obsta que hajam quebras de sigilo judicialmente para se apurar os dados dos criadores dos canais, para processos cíveis e criminais. Como fazer isso como eficácia e eficiência, e como investigar tais delitos, é outra história.
Fechar o Justin.tv? A história já demonstrou não ser possível, ou você não se lembra do napster, kazaa, limewire, Orkut, Youtube, etc...
Se a briga, no Brasil, ainda é pelo ponto adicional, liberado recentemente (3) é impossível prever o futuro da radiodifusão com a popularização dos modernos videocasts, como o Justin.tv.
José Antonio Milagre possui MBA em Gestão de Tecnologia da Informação pela Universidade Anhanguera. É Analista de Segurança e Programador PHP e C, Perito Computacional em São Paulo e Ribeirão Preto, Advogado Especializado em Direito da Tecnologia da Informação pelo IPEC-SP, graduado pela ITE-Bauru, Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Fênix-SP, com defesa de tese e área de concentração Crimes Eletrônicos, Valor Probatório e o Papel da Computer Forensics, Extensão em Processo Eletrônico pela Universidade Católica de Petrópolis-RJ, Treinamento Oficial Microsoft MCP, Certificação Mobile-Forensics UCLAN-USA/2005, Professor Universitário nos cursos de TI e Direito da Anhanguera Educacional e de Direito e Perícia Eletrônica na Legal Tech em Ribeirão Preto-SP , Professor da Pós-Graduação em Direito Eletrônico pela UNIGRAN, Dourados/MS (Perícia Computacional), Professor da Pós-Graduação em Segurança da Informação do Senac-Sorocaba, Professor da Pós-Graduação em Computação Forense da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Vice-Presidente da Associação Brasileira de Forense Computacional e Presidente da Comissão de Propriedade Intelectual e Segurança da Informação da OAB/SP 21 a . Subsecção, membro do Comitê de Comércio Eletrônico da FECOMERCIO-SP, membro do GU LegislaNet e TI Verde da SUCESU-SP e palestrante convidado SUCESU-ES. Professor Convidado LegalTech, UENP-Jacarezinho, UNESP, FACOL, ITE, FGP, nas áreas de Segurança da Informação, Direito Digital e Repressão a crimes eletrônicos. Co-Autor do Livro "Internet: O Encontro de dois mundos, pela Editora Brasport, ISBN 9788574523705, 2008.